quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

30 Anos de Democracia

São todos iguais. Esta é uma das frases mais ouvidas entre os cidadãos deste país relativamente aos políticos.
Embora alguns se esqueçam que o serviço político pressupõe integridade humana, outros há que a possuem e que conseguem uma gestão desinteressada e transparente do poder, através de um empenho diário para manter o exemplo, a seriedade, a responsabilidade e a coerência, exigidos a quem cumpre o seu dever com competência.
Volvidos trinta anos após a Revolução de 1974, é pertinente reflectir-se sobre a nossa democracia. No início, primava o valor ideológico e os cidadãos apoiavam os partidos políticos, ora inscritos, ora como meros simpatizantes. Agora, alguns querem atribuir a culpa aos partidos, enquanto instituições ou organizações, defendendo estar acima dos partidos e que o mais importante são as pessoas. Todos reconhecem, certamente, que o mal está nas pessoas que utilizam os partidos (para servir-se e não para servir o próximo) e não nos partidos, nem nos valores que defendem, nem muito menos nas ideologias que apregoam. É esta imagem de seriedade e de missão que nem sempre está presente naqueles que têm responsabilidades de governo e de gestão.
A nossa democracia e a liberdade permitem que cada cidadão, com a idade igual ou superior a dezoito anos, possa escolher, sem esquecermos que o voto, antes de ser para nós um dever, foi um direito conseguido por outros. Votando, temos o direito de exigir a quem foi eleito que corresponda com as promessas que fez. É nosso dever votar sempre, pois temos deveres para podermos exigir os nossos direitos e só temos direitos se cumprirmos com os nossos deveres. Não nos devemos demitir de um processo eleitoral, pois se não escolhermos, estamos a permitir que outros o façam por nós. A abstenção pode ser entendida como uma demissão ou como um acto de falta de coragem, por isso, é de estranhar que alguém, dentro do sistema, consiga apelar ao voto em branco. Seria minimamente compreensível este apelo se viesse de alguém de fora do sistema, no entanto, seria bom sabermos qual seria a alternativa: Uma ditadura? Uma aristocracia? Um outro regime autocrático? Uma anarquia? Talvez seja justificável por falta de sensatez e de maturidade políticas, ou então, por nunca ter conseguido vencer quando se candidatou.
Falar é fácil. Imaginar também o é. Trabalhar, praticar, servir o próximo, com integridade, numa sociedade sem segredos, em que tudo se descobre, é mais difícil e nem todos o conseguem. Por isso, nunca é de mais louvar todos aqueles (e estão em maioria) que exercem o serviço político com honestidade, responsabilidade e competência.
Naturalmente que nem tudo vai bem e que a política precisa de mais e de maior credibilidade. Numa sociedade em que os valores parecem estar em queda livre, é urgente pensar-se uma forma diferente para informar e cativar as pessoas para a política. Esta é uma tarefa urgente que compete essencialmente aos partidos políticos levar a efeito. Os políticos devem estar mais abertos e atentos à sociedade civil e às necessidades dos cidadãos. Nos partidos deve prevalecer o direito à liberdade de expressão e todos os seus membros devem ser respeitados, o que pode ser rentabilizado nas estruturas internas de cada partido, de modo a serem encontradas as melhores soluções. Enquanto as estratégias passarem mais pelas pessoas do que pelos projectos, enquanto se ligar mais às listas e aos nomes das pessoas do que ao que é necessário fazer, é difícil alcançar-se um porto seguro.
A nossa democracia só tem sentido com a participação dos cidadãos, por isso considera-se fundamental renovar algumas estratégias e alguns políticos.
Não se deve pactuar com aqueles políticos que fogem aos impostos, com os que exercem pressões sobre a justiça, com os que beneficiam amigos ou familiares, com os que exercem a política do compadrio, com os que aliciam outros no exercício do poder, com os que se vendem por interesses regionais, locais ou pessoais. Os políticos têm obrigação de trabalhar desinteressadamente pelo bem de todos e os cidadãos têm o dever de apelar às suas responsabilidades. A arma da democracia consiste em ter vigor na denúncia e acreditarmos na ideologia. Denunciar tudo o que não siga as normas da coerência, honestidade, seriedade e carácter políticos, bem como acreditar poder viver onde todos decidem como se fossem um todo no interesse de todos, devem ser as prioridades.
Cada cidadão, num estado de direito democrático, consciente de que uma verdadeira democracia é pluripartidária, deve: fazer as suas escolhas, ter opiniões fundamentadas e espírito crítico, e optar por uma determinada linha ideológica, ou mesmo, por um partido político legalmente instituído.
Embora seja preciso mudar algumas formas de fazer política e alguns políticos, temos sempre que saber respeitar a diferença, reconhecer e respeitar a liberdade de opinião e de acção de cada um dos humanos.
Serão mesmo todos iguais? Claro que não.
Ao pensarmos em cada político, mais ou menos conhecido, individualmente, concluímos que a maioria dos políticos está no caminho certo, no entanto, nunca é de mais, numa democracia de escolhas livres: apelar a um tempo de convicções pelas quais valha a pena lutar; apostar num desenvolvimento humanizado, restituindo à política a nobreza da sua função enquanto instrumento ao serviço da vida; pedir aos políticos em geral e a todos os cidadãos em especial que não esqueçam o dever de servir e não de ser servidos.

J. Nuno Vieira de Araújo
In Cardeal de Saraiva, 30Abril2004

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